Opinião: A Sentinela (Richard Zimler)

A Sentinela by Richard Zimler
Editora: Porto Editora (2013)
Formato: Capa mole | 424 páginas
Géneros: Mistério/Thriller
Descrição: "6 de julho de 2012. Henrique Monroe, inspetor-chefe da Polícia Judiciária, é chamado a um luxuoso palacete de Lisboa para investigar o homicídio de Pedro Coutinho, um abastado construtor civil. Depois de interrogar a filha da vítima, Monroe começa a acreditar que Coutinho foi assassinado ao tentar defender a perturbada adolescente do violento assédio sexual de algum amigo da família. Ao mesmo tempo, uma pen que o inspetor descobre escondida na biblioteca da casa contém alguns ficheiros com indícios de que a vítima poderá também ter sido silenciada por um dos políticos implicados na rede de corrupção que o industrial montara para conseguir os seus contratos.
Tendo como pano de fundo o Portugal contemporâneo, um país traído por uma elite política corrupta, que sofre sob o peso dos seus próprios erros históricos, Richard Zimler criou um intrigante policial psicológico, com uma figura central que se debate com os seus demónios pessoais ao mesmo tempo que tenta deslindar um caso que irá abalar para sempre os muros da sua própria identidade."
Aviso: Contém SPOILERS!
Richard Zimler já me tinha chamado a atenção com a sua obra "O último Cabalista de Lisboa". Afinal, quantos estrangeiros é que decidem estudar o nosso pequeno país e arriscam escrever sobre a nossa história? Muito poucos, suponho. Para além disso, toda a gente diz maravilhas da já referida obra, pelo que, quando vi este livro na loja e percebi que se passava também em Portugal, fiquei ainda com mais curiosidade.

Henrique "Hank" Monroe é detetive da Polícia Judiciária. Vive em Portugal, de onde é originária a sua mãe e é, aparentemente, uma pessoa o mais normal possível. Mas a verdade é que Hank tem segredos, que se prendem com o seu trágico passado no Colorado. E este livro, "A Sentinela", é tanto sobre a investigação de Monroe sobre o assassínio de um dono de uma empresa de construção como sobre esse passado.

A minha leitura deste livro foi... complicada. Não posso negar que é um livro interessante e bastante bem escrito, no geral, se bem que sofre um pouco por não "saber exatamente o que quer ser"; se livro de ação/thriller, se livro introspetivo sobre a natureza humana. Penso que o meu problema com este livro, para além do facto de ser tão realista que é deprimente é que o balanço entre estas duas vertentes não foi assim muito bem conseguido.

Hank tem uma panóplia de problemas psicológicos (psiquiátricos mesmo), que têm origem no seu passado. Basicamente, o pai de Hank era um sociopata e gostava de torturar os filhos e a mulher. Como resultado, Hank criou uma personalidade alternativa, uma espécie de guardião meio selvagem, cujo objetivo é proteger o seu irmão, Ernie. Gabriel, esta segunda personalidade, é um investigador nato que permite a Hank ser um ótimo inspetor. Mas Gabriel pode também causar problemas.

Por outro lado, temos o homicídio de Coutinho, o dono de uma empresa de construção civil que é, claro, corrupto e tudo o mais. A ligação entre o passado de Hank e uma das vítimas deste crime, a filha de Coutinho, faz com que o primeiro sinta que tem de resolver este caso.

Esta dualidade no enredo é interessante, sim, mas creio que não foi explorada de forma eficaz. Gabriel, a personalidade alternativa, aparece diversas vezes durante a história mas nunca temos oportunidade de o ver em ação. Como Hank "perde a consciência", também o leitor fica no escuro relativamente às ações de Gabriel. Esta personagem, que é, no fundo, parte integrante de Hank, nunca é explorada convenientemente e fiquei com a impressão de que só conhecemos metade do protagonista.

Quanto ao mistério, tem contornos sinistros mas é relativamente fácil perceber o que se passou. O desfecho foi tipicamente português, por assim dizer, o que é... bem, deprimente.

O ritmo da narrativa é irregular, passando de envolvente a descritiva e introspetiva, o que fez com que, por vezes tivesse alguma dificuldade em continuar a leitura.

No fundo, este livro está bem construído q.b., tanto em termos de mistério como de "narrativa introspetiva", em que o protagonista sofre alterações e muda devido aos acontecimentos, mas as duas partes não "encaixam" a 100%: nem Hank nem o mistério recebem o tempo de antena que "merecem".

No geral, uma leitura algo desigual, com partes interessantes e partes algo aborrecidas. "A Sentinela" é um livro realista, algo chocante e muito introspetivo nalgumas partes e devo dizer que isso fez com que gostasse e não gostasse da leitura. É um livro algo incómodo.

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